sábado, 28 de dezembro de 2013

A Casa Caiu - A Verdade Apareceu e a Ditadura tem sua Máscara Arrancada.

No balanço divulgado na segunda-feira 21, a Comissão Nacional da Verdade fez um enorme favor ao Brasil. A CNV revelou que as torturas ocorridas durante a ditadura não foram uma resposta à luta armada, como afirmaram por anos o ex-integrantes do regime e seus apoiadores, mas tiveram início logo após a derrubada de João Goulart. É a desconstrução de uma das maiores mentiras políticas das últimas décadas no Brasil.
As palavras da historiadora Heloísa Starling, assessora da comissão, não deixam dúvidas. Segundo ela, a tortura foi “introduzida como padrão de repressão, enquanto técnica de interrogatório nos quartéis, a partir de 1964” e explodiu a partir de 1969, depois do Ato Institucional 5 (publicado no fim de 1968). A CNV identificou centros de detenção e tortura a partir de 1964 e verificou que tais violações não eram praticadas de forma pontual. Eram, sim “a base da matriz da repressão da ditadura".
Por anos, os admiradores da ditadura brasileira afirmaram que o recurso à tortura foi uma resposta à luta armada. Violar os direitos humanos de brasileiros seria, segundo esta versão, a única forma de evitar um “mal maior”, a implantação de um regime comunista no Brasil. A lógica é semelhante à adotada por quem apoia as torturas realizadas pela CIA na “guerra ao terror” dos Estados Unidos. Neste clima messiânico de combate ao “mal”, vale tudo e qualquer coisa para evita-lo, até mesmo abrir mão de valores democráticos e, em último caso, da própria democracia.
No caso do Brasil, o descalabro deste tipo de argumento é ainda mais agudo. Se o terrorismo contra interesses norte-americanos é real, o mesmo não se pode dizer da ameaça comunista por essas bandas.
Como escreveu o historiador Rodrigo Patto Sá Motta, o temor anticomunista no Brasil teve “papel preponderante no processo de arregimentação dos grupos adversários ao governo [Goulart], fornecendo o principal argumento que unificou os setores de oposição”. Os líderes do golpe realmente acreditavam na ameaça comunista, escreve Sá Motta, mas tinham uma “avaliação imprecisa da extensão” dela e, ainda assim, “se esforçaram para convencer o público de que os bárbaros estavam à porta”. Não é difícil entender como esta campanha, somada à lógica de que vale tudo para evitar o barbarismo (inclusive adotar os mesmos métodos dos bárbaros) culminou na prática da tortura.
A fantasia a respeito do “perigo vermelho” continua a grassar, como revela a ironia da comunidade do Facebook Golpe Comunista 2014 no Brasil, mas aqueles que tentam legitimar a prática da tortura diante da atuação dos grupos da luta armada talvez fiquem ao menos um pouco mais constrangidos.
Apesar do avanço, falta ao Brasil, ainda, desvendar outra mentira criada pela ditadura: a de que a Lei da Anistia é fruto de um “acordo político” entre governo e oposição. Criada para anistiar aqueles que combatiam a ditadura, a lei foi travestida de perdão eterno aos agentes estatais brasileiros que violaram direitos humanos da população brasileira. Tal mentira persiste apesar de a anistia ter sido aprovada apenas pela Arena (o MDB votou em peso contra a lei), e após grandes protestos contra ela. De forma vexatória, a falácia foi referendada pelos ministros do STF Eros Grau, Ellen Gracie, Cezar Peluso (já aposentados), Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso de Mello em 2010. Enquanto esta mentira persistir, o Estado brasileiro continuará em dívida com sua população.

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

A Lei que Cria o Criminoso

As ciências criminais puseram em evidência a relatividade do conceito de infração, que varia no tempo e no espaço, de tal modo que o que é ‘delituoso’ em um contexto é aceitável em outro. Conforme você tenha nascido num lugar ao invés do outro, ou numa determinada época e não em outra, você é passível – ou não – de ser encarcerado pelo que fez, ou pelo que.
Não há nada na NATUREZA do fato, na sua natureza INTRÍNSECA, que permita reconhecer se se trata ou não de um crime – ou de um delito. O que há em comum entre uma conduta agressiva no interior da família, um ato violento cometido no contexto anônimo das ruas, o arrombamento de uma residência, a fabricação de moeda falsa, o favorecimento pessoal, a receptação, uma tentativa de golpe de Estado etc.? 
Você não descobrirá QUALQUER denominador comum na definição de tais situações, nas motivações dos que nelas estão envolvidos, nas possibilidades de ações visualizáveis no que diz respeito à sua prevenção ou à tentativa de acabar com elas. A única coisa que tais situações têm em comum é uma ligação completamente artificial, ou seja, a competência FORMAL do sistema de justiça criminal para examiná-las. O fato de elas serem definidas como 'crimes' resulta de uma decisão humana modificável; O CONCEITO DE CRIME NÃO É OPERACIONAL. Um belo dia, o poder político para de caçar as bruxas e aí não existem mais bruxas.

Até 1975, na França, o marido podia fazer encarcerar sua mulher por adultério. Depois desse ano, uma lei que reformou o divórcio DESCRIMINALIZOU tal conduta e, daí em diante, a mulher adúltera não pôde mais ser processada perante um juiz criminal.

De um dia para o outro, o que era delito deixa de sê-lo e aquele que era considerado delinqüente se torna um homem honesto, ou, pelo menos, não tem mais que prestar contas à justiça penal. É a lei que diz onde está o crime; ‘É A LEI QUE CRIA O CRIMINOSO’.


LOUK HULSMAM, 1993, páginas 63 e 64, grifos no original.

domingo, 22 de dezembro de 2013

Midia e Sistema Penal - Por Nilo Batista

Sabe-se hoje que a criminalização secundária – realizada seletivamente, e ainda assim na dependência de fatores aleatórios que, dentre outros, vão da iniciativa ou omissão da vítima em registrar o delito ao interesse
ou desinteresse da agência policial em investigá-lo – a criminalização secundária não passa de ser pífia amostragem, construída segundo o jogo dos estereótipos criminais e das vulnerabilidades sociais, do grande incognoscível da criminologia: a criminalidade real (ou seja, a totalidade dos fatos que poderiam subsumir-se na programação criminalizante primária, nas leis penais). Por isso mesmo se afirma que o poder criminalizante secundário é “pouco significativo no marco total do controle social”, e que a criminalização secundária “é quase um pretexto” para um “formidável controle configurador positivo da vida social, que em
nenhum momento passa pelas agências judiciais” ; a vigilância sobre a população. Detenções breves, esclarecimentos de identidade, observação das atividades, registros oficiais ou paralelos, “grampos” telefônicos – autorizados ou não –, acesso clandestino a informações sigilosas bancárias ou fiscais são alguns exemplos desse poder de vigilância que o sistema penal, mesmo paralela ou subterraneamente, exerce. O vigilantismo nasceu no capitalismo industrial, e devemos a Bentham sua formulação mais sincera e alucinada. O panóptico não era uma proposta restrita à penitenciária, mas estendia-se às fábricas, às escolas, aos asilos e hospitai. Inteiramente compatível com a idéia benthamiana de que os pobres também deveriam usar uniforme, o panóptico era o princípio básico de uma sociabilidade da vigilância muito cara ao empreendimento burguês-industrial. A prevenção extremada e invasiva deste modelo se inviabilizou espacialmente, na segunda metade do século XIX, com a modernização e o crescimento das cidades. Substituído, na vigilância do disperso exército de reserva da mãode-obra industrial, por um artefato “científico” do positivismo, a periculosidade pré delitual que poderia ativar um medida de segurança detentiva, o princípio hibernaria à espera das condições tecnológicas que lhe concederiam um segundo e glorioso ciclo. Nessa linha, Arlindo Machado pergunta: “o que são os modernos sistemas de vigilância
senão a atualização e a universalização do panóptico”?

Nilo Batista pag. 10 - Midia e Sistema Penal.

Manifestante foi Condenado ----- E ainda dizem que estamos em uma Democracia.

Na semana passada, Vieira foi transferido da cadeia pública de Japeri para o presídio de Bangu 5, no subúrbio da capital fluminense, onde deve cumprir 5 anos e 10 dias de prisão, em regime fechado, pela posse de duas garrafas de líquidos que, segundo a sentença, são considerados "aparato incendiário ou explosivo".
Vieira nega a posse dos objetos, descritos na sentença como coquetel molotov. "Não é justo", diz. Ele alega que não participava das manifestações. Na última quinta-feira, aceitou receber o Estado no Presídio Elizabeth Sá Rego, onde aguarda que advogados dedireitos humanos recorram da sentença do juiz Guilherme Schilling Duarte, proferida no dia 2.
"Não estava quebrando nada. Não estava tocando fogo em nada", diz Vieira na sala da escola da unidade do complexo prisional fluminense, que abriga mais de 20 mil detentos. No pavilhão no qual ele foi alojado havia, na quinta-feira, 908 presos.
Planejando aprender o ofício de garçom no programa de reinserção social de internos oferecido no Bangu 5, ele não se conforma com a sentença. "Estava chegando para dormir no casarão", conta.
O rapaz alega que na noite do dia 21 de junho havia chegado do trabalho para dormir na região da Lapa quando encontrou garrafas com detergente, fechadas, na entrada do prédio. A polícia reprimia uma manifestação que reunia, segundo o texto do processo, 300 mil pessoas "em prol das melhorias dos serviços públicos".
Vieira se emociona ao lembrar que foi chamado por policiais por estar com as garrafas nas mãos - naqueles dias havia manifestantes que levavam garrafas de vinagre para combater os efeitos do gás lacrimogêneo da PM e outros usavam os recipientes como bombas incendiárias.
O jovem diz que atravessou a rua para atender ao chamado dos policiais. A partir daí, segundo ele, foi preso, espancado, e levado para a delegacia. Não saiu mais da cadeia. Cinco meses depois, foi julgado como réu e preso. E pegou pena máxima para o artigo 16 (Lei 10.826/03).
Risco. Na sentença, o juiz Guilherme Schilling Duarte descreve o relato de policiais testemunhas da prisão. "O réu ora presente entrou naquela loja (o casarão) com uma mochila e em seguida saiu com dois frascos em suas mãos", diz o texto. E prossegue afirmando que "as garrafas encontradas com o réu tinham estopim no gargalo" e que "o incendiamento daqueles artefatos seria capaz de colocar em risco as demais pessoas".
O juiz prossegue: "Atente-se que o réu declarou uma versão pueril e inverossímil, no sentido de que teria encontrado as duas garrafas lacradas - uma (sic) segundo ele contendo ‘Pinho Sol’ e outra água sanitária". E fixa a sentença: pena de 4 anos e 10 dias. Em seguida, por considerar o rapaz "reincidente" - ele já havia sido preso por roubo, em 2006, o juiz acrescenta mais um ano de cadeia.
De acordo com o diretor do presídio de Bangu 5, Émerson Luís Neves Paiva, Vieira já era um conhecido. O rapaz cumpriu 1 ano e 8 meses de prisão por roubo.
"Ele é um sujeito tranquilo, não devia mais nada", conta o diretor. "A falha dele", segundo Paiva, foi não comparecer em juízo para assinar presença exigida quando o preso tem o benefício da liberdade condicional. "Mas ele não era um foragido."
Outras garrafas. No presídio, Vieira sustenta a versão segundo a qual as garrafas que carregava na hora da prisão não eram aquelas apresentadas pelos policiais. Sem receber visitas na cadeia, ele nem sabe se a família já foi avisada da condenação. Filho de família de baixa renda da Penha, na periferia do Rio, o jovem abandonou a escola na 5.ª série.
Sem profissão definida, vivendo como catador de latas e vendendo objetos usados, Vieira conta com uma redução da pena para recomeçar a trajetória interrompida numa noite de manifestações.
ONG pede nova perícia e pretende apelar da sentença
O advogado Felipe Coelho, da ONG Instituto de Defensores de Direitos Humanos (IDDH) do Rio, disse na sexta-feira que o primeiro recurso em defesa de Rafael Braga Vieira foi uma ação de embargo para preservar as provas do processo, que a sentença ordena que sejam destruídas. "Queremos fazer uma nova perícia. Depois, vamos entrar com a apelação da sentença", afirma o advogado. Para Coelho, Vieira está preso "porque é negro e pobre".
O advogado diz que o IDDH já encaminhou documento denunciando o caso a organismos internacionais de direitos humanos na ONU. Para Coelho, Vieira não tem engajamento político e não participou de movimento nenhum reivindicatório. "Ele é vítima de uma visão deturpada sobre moradores de rua no Rio. Se fosse branco, com condição social melhor, pensariam duas vezes antes de prender e condenar", diz o advogado.

"Rafael estava no lugar e na hora errados", diz a advogada Raphaela Lopes, também do IDDH. Os defensores tentarão argumentar, para revisão de decisão, que Vieira é um "preso político". 

Grande Mujica - Um dia teremos um Político Assim.

JOSÉ MUJICA (Presidente do Uruguay) sobre indicaçao para prémio nobel da Paz... Assim é que se fala !!!! Embrulha !!! “Estão loucos. Que prêmio da paz, nem prêmio de nada. Se me derem um premio desses seria uma honra para os humildes do Uruguai para conseguirem uns pesos a mais para fazer casinhas... no Uruguai temos muitas mulheres sozinhas com 4, 5 filhos porque os homens as abandonaram e lutamos para que possam ter um teto digno... Bom, para isso teria sentido. Mas a paz se leva dentro. E o prêmio eu já tenho. O prêmio está nas ruas do meu país. No abraço dos meus companheiros, nas casas humildes, nos bares, nas pessoas comuns. No meu país eu caminho pela rua e vou comer em qualquer bar sem essa parafernália de gente de Estado.”

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

QUEM É A DIREITA BRASILEIRA?

O sr. Reinaldo Azevedo, a quem injustamente referiu-se a ombudsman da Folha de S. Paulo como rottweiler do conservadorismo, continua a desmentir sua colega de redação. Qualquer comparação com uma raça canina tão forte e cheia de personalidade é realmente despropositada. Se o nobre animal lesse jornal, provavelmente se sentiria insultado. O colunista, tanto pelas posições que defende quanto por estilo, está mais para cachorrinho de madame.
Deu-nos mais uma prova, no dia 6 de dezembro, em artigo intitulado "Direita já!", de qual é o seu pedigree. A ideia básica é que falta, no Brasil, uma força política que tenha competitividade eleitoral e, abraçando claramente valores de direita, faça oposição ao governo. Ou que acredite na hipótese de se tornar dominante exatamente por defender esses valores. Ainda mais longe vai o santarrão do conservadorismo: o PT provavelmente continuará a governar porque não seria possível "candidatura de oposição sem valores de oposição".
O que Azevedo esconde do leitor, por ignorância ou má fé, são as razões pelas quais a direita brasileira atua disfarçada. Esse campo ideológico, afinal, esteve historicamente comprometido com a quebra da Constituição, o golpismo e a instituição de ditaduras. Seus valores de raiz são o autoritarismo, o racismo de índole escravocrata, o preconceito social, o falso moralismo e a submissão às nações que mandam no mundo. Vamos combinar que não é fácil conquistar apoios com essa carranca.
Não é de hoje que direitistas recorrem a truques de maquiagem para não serem reconhecidos. A mais comum dessas prestidigitações tem sido a de se enrolar em supostas bandeiras democráticas para cometer malfeitos. Exemplo célebre é o golpe militar de 1964, quando bateram nas portas dos quartéis e empurraram o país para uma longa noite de terror, em nome da liberdade e da democracia.
A ditadura dos generais foi o desfecho idealizado pela "direita democrática", depois que se viu sem chances de ganhar pelo voto e tomou o caminho da conspiração. O suicídio de Getúlio Vargas sustou a intentona por dez anos, mas os ídolos de Azevedo estavam à espreita para dar o bote. As provas são abundantes: estão presentes não apenas nos discursos de personalidades da "direita democrática" de antanho, mas também nas páginas dos jornalões da época, que clamavam pela ruptura constitucional e a derrubada do presidente João Goulart.
Algumas dissidências desse setor, a bem da verdade, tentaram se reconciliar com o campo antiditadura, depois de largados na estrada pelos generais ou frustrados com sua truculência. A maioria dos azevedinhos daquele período histórico, no entanto, seguiu de braços dados com a tortura e a repressão. Eram ativistas ou simpatizantes do partido da morte. Batiam continência como braço civil de um sistema talhado para defender os interesses das grandes corporações, impedindo a organização dos trabalhadores e massacrando os partidos de esquerda.
O ocaso do regime militar trouxe-lhes isolamento e desgaste. A direita pró-golpe, mesmo transmutada em partidos que juravam compromisso com a democracia reestabelecida, não teve forças para forjar uma candidatura orgânica nas eleições presidenciais de 1989. Acabaram apoiando Fernando Collor, um aventureiro de viés bonapartista, para enfrentar o risco representado por Lula ou Brizola. O resto da história é conhecido.
Depois deste novo fracasso, as forças reacionárias ficaram desmoralizadas e sem chão. Trataram, em desabalada carreira, de aderir a algum pastiche que lhes permitisse sobrevida, afastando-se o quanto podiam da herança ditatorial que lhes marcava a carne. Viram-se forçadas a buscar, entre as correntes de trajetória democrática, uma costela a partir da qual pudessem se reinventar. Encontraram no PSDB, capturado pela burguesia rentista, o instrumento de sua modernização e o novo organizador do bloco conservador.
A mágica acabou, porém, quando o PT chegou ao Planalto, deslocando para a esquerda boa parte do eleitorado que antes era seduzido pelo conservadorismo. Esse foi o resultado da adoção de reformas que modificaram e universalizaram providências antes circunscritas a tímidas medidas compensatórias, como parte de um projeto que permitiu a ascensão econômico-social da maioria pobre do país. Tais conquistas tingiram de cores fúnebres, na memória popular, o modelo privatista e excludente sustentado pelo tucanato.
Enquanto a direita republicana tratava desesperadamente de estabelecer vínculos entre o sucesso do governo petista e eventuais políticas do período administrativo anterior, evitando reivindicar seu próprio programa, outro setor deu-se conta que, sem diferenciação clara de projetos, seria muito difícil reconquistar maioria na sociedade e romper a dinâmica estabelecida pela vitória de Lula em 2002.
Não haveria saída, contra o petismo, sem promover a mobilização político-ideológica das camadas médias a partir de seus ímpetos mais entranhadamente individualistas, preconceituosos e antipopulares. Ao contrário de uma tática que encurtasse espaços entre os dois polos que definem a disputa nacional, o correto seria clarificar e radicalizar o confronto.
As legendas eleitorais do conservadorismo titubeiam a fazer dessa fórmula seu modus operandi, mas os meios tradicionais de comunicação passaram a estar infestados por gente como Azevedo e outros profetas do passado. A matilha não tem votos para bancar nas urnas uma alternativa à sua imagem e semelhança, é verdade. Seria um erro, no entanto, subestimar-lhe a audiência e o papel de vanguarda do atraso que atualmente exerce nas fileiras oposicionistas.
Até porque conta com uma fragilidade da própria estratégia petista, de melhorar a vida do povo através da ampliação de direitos e do consumo, mas atenuando ao máximo o enfrentamento de valores e o esforço para modificar as estruturas político-ideológicas construídas pela oligarquia, especialmente os meios massivos de comunicação. O PT logrou formar maioria eleitoral a partir dos avanços concretos, mas não impulsionou qualquer iniciativa mais ampla para estabelecer hegemonia cultural e ideológica.
Seria persistir neste equívoco não dar o devido combate ao conteúdo programático do discurso azevedista. Sob o rótulo de "direita democrática", o que respira é uma concepção liberal-fascista, forjada na comunhão das ditaduras chilena e argentina com a escola de Chicago e os seguidores do economista austríaco Ludwig Von Mises.
O velho fascismo, que trazia para dentro do Estado as operações dos conglomerados capitalistas, tornando-os parasitas econômicos da centralização política, efetivamente caducou como resposta aos próprios interesses grão-burgueses. Entre outros motivos, porque retinha parte ponderável da taxa de lucro para o financiamento do aparato governamental.
A combinação entre ultra-liberalismo e autoritarismo converteu-se em um modelo mais palatável entre as elites. O Estado assumia as tarefas de repressão e criminalização das lutas sociais, na sua forma mais perversa e violenta, soltando as amarras legais e sociais que regulavam o desenvolvimento dos negócios em âmbito privado. Não eram à toa os laços afetuosos que uniam Margaret Thatcher e Ronald Reagan ao fascista Pinochet. O neoconservadorismo se trata, afinal, do liberal-fascismo sem musculatura ou necessidade de realizar seu projeto histórico até o talo.
Claro que o ladrar de Azevedo e seus parceiros não é capaz, nos dias que correm, de ameaçar a estrutura democrática do país. Mas choca o ovo da serpente pelas ideias e valores que representa. A melhor vacina para a defesa da democracia, contudo, como dizem os gaúchos, é manter a canalha segura pelo gasganete. Os latidos dos cachorrinhos de madame devem ser repelidos, antes que se sintam à vontade para morder.
Breno Altman é jornalista, diretor editorial do site Opera Mundi e da revista Samuel.

Os Pontilhados são para completar com o que você entender melhor adequar.


Nós somos ----------, porque há vários séculos, temos sido vítimas de todos os tipos de governos, que ao longo dessa tirania, foi aparecendo mais um ladrão, mais um fanático, mais um assassino mais um déspota. Nós somos ----------- porque nós achamos que não existem razões para ser explorado e para que tenhamos de trabalhar para que um grupo de sem vergonhas se tornem milionários. Nós somos -------------, porque não aceitamos nas leis que são inventadas para assassinar e sufocar o nosso grito de protesto. Nós somos ------------- porque não acreditamos nas suas guerras, em suas pátrias. Nós somos -------------- porque detestamos sua polícia, os seus generais, reis e presidentes. Nós somos ------------------, porque, ao contrário deles, sofremos com as desgraças humanas. Nós somos ----------------, porque queremos vida livre, saudável, de respeito mútuo e igualdade para os nossos filhos e filhas. Nós somos ------------ porque não agüentamos ver as lágrimas de tantas pessoas boas, humildes, que têm sido enganadas geração após geração. Nós somos -----------------, porque estamos envergonhados desse sistema, em que vemos, não só morte, mas: fome, prisões, repressão, desigualdade, e alienação além de milhões de mentiras. Nós somos --------------- porque conhecemos o seu poder, a sua força, seu terrorismo, a calúnia, vocês nos assassinam nos encarceram, nos difamam.
Chamamos de terroristas, algumas pessoas que dominam outras pessoas com bombas, tanques, armas, prisões,torturas e execuções, hospitais psiquiátricos e a mentira do inferno. Dizem que ------------- é o caos, mas na sua sociedade capitalista é que vemos criminalidade, prostituição, desigualdade, destruição, ao mesmo tempo: excesso de comida e milhões de seres humanos morrendo de fome, bombardeios de povoados, cidades, países inteiros, arrasam tudo com sua ganância causando pânico geral.
Sua ambição, seu egoísmo, sua burrice, Sua cegueira e loucura pelo poder está destruindo a você mesmo, os seu filhos e seus netos não vão querer lembrar de você, seu sistema está em caos porque é sustentado por mentiras, terror, artigos, Códigos, leis, recompensas e punições. É por isso que somos -------------------, para mudar esta sociedade positivamente, para que você se cure dessa loucura perigosa, Nós somos ----------------, porque é necessário que haja alguém para gritar suas atrocidades, porque não temos medo, como muitos não tiveram. Nós somos -------------------- nas ruas, na prisão, na cadeira elétrica, no julgamento e nos cemitérios.
Porque ser um ------------- é ser muitas coisas que você nem compreende nem tem capacidade de entender, e assim, nos assassinam desde séculos atrás, nos põem a culpa e nos aprisionam, alienam soldados e policias para que vos defendam, usam de todas as artimanhas para nos derrubar, mas, chegam a conclusão de que, para cada ------------ que vocês assassinam, nasce outro.
Não iremos lhes perdoar, não jogaremos o seu jogo, somos aqueles que não crêem em suas promessas, dói em vocês quando defendemos a liberdade e a igualdade, acreditamos na arte, no progresso, na educação, não precisamos nem de deuses, nem mestres, acreditamos nos seres humanos, na Natureza, nos direitos e deveres de cada um, queremos uma sociedade de paz, amor e respeito mútuo, uma sociedade que não parece ser nada igual a sua, queremos uma sociedade -----------.

Você trabalha o dia inteiro, E não descansa há muito tempo, Não tem direito a nada, Isso é culpa do governo!

Você recebe muito pouco, Não há como se divertir O dinheiro não sobra pra nada, Isso é culpa do Governo!

Governar não é roubar..
Político não é ladrão...
Se isso não for mentira..
Então me prove que não!

Governar não é roubar..
Político não é ladrão...
Se isso não for mentira..
Então me prove que não!

Os impostos são muito altos, Assim não há jeito de viver, Então me diga de quem é a culpa!
Isso é culpa do governo

Porque existem diferenças?
Porque existe racismo?
E até o maldito capitalismo
A culpa é toda d Governo!

Governar não é roubar...
Político não é ladrão...
Se isso não for mentira..
Então me prove que não!

Governar não é roubar..
Político não é ladrão...
Se isso não for mentira..
Então me prove que não!

-Piazitos Muertos

Quando a máscara branca torna-se negra.


Eu era um manifestante como tantos outros, exigindo pacificamente, meus direitos, eu abracei a ideia da igualdade, da mudança pacífica e fui as ruas, não apenas por 20 centavos, mas por um Brasil mais justo. 

Eu olhava outros cidadãos cantando, vibrando com alegria, com indignação, alguns com mascaras (eu inclusive), outros apenas com um sorriso. A máscara era não de um personagem, mas de uma ideia, de um "V" que feito Frankstein, se revolta contra aqueles que o criaram. Revoltado contra o "governo" que criou estas situações, achei que a mascara ajudava a exprimir uma ideia.

Nenhuma arma, apenas uma mascara plastica fina. O povo nas ruas... tudo pacífico, até que de uma rua lateral veio o barulho ritmado e seco, chamou a atenção, olhei a uns 20 metros, apareceu uma coluna de homens de cinza e preto, tomando a rua impedindo a passagem, como quem vê nuvens de tempestade, cinzas e pretas no céu, ja procurei um abrigo, bom sinal aquilo não poderia ser, achei uma árvore, pareceu um trovão, pensei durante alguns segundos se aquilo era real, pois pessoas gritavam sem violência, ninguém armado, e a tropa de choque, que chegou batendo nos escudos, simplesmente, abriu fogo.

O assobio daquela bala de borracha que deve ter passado a milímetros da minha orelha, e algo inesquecível, e o grito do jovem que foi atingido também ,a poucos metros atrás de mim. Ouvi mais tiros, e vieram as bombas de gas. Mulheres, que estava na manifestação, homens, pessoas com mais idade....sabe aquelas coisas que você não acredita, que parece ser um filme ou algo que você nunca vai ver no solo do seu pais, o governo simplesmente resolveu usar, tudo de não letal, em pessoas que,nada faziam alem de clamar por seus direitos. 

O cheiro do gás, virou o estomago, e o jovem que foi atingido no peito por uma bala de borracha estava caído gritando, surreal. Uma mascara, uma calça jeans com um moleton por baixo, uma mascara fina no rosto e uma camiseta.... A linha avançou alguns passos vi passar o primeiro "capacete branco" com cassetete nas mãos, sem conversa, sem perdão, seu "porrete" achou as costas de um rapaz que protegia uma garota próxima a ele, sabe aquela atitude romântica de abraçar alguém em uma hora de perigo, pois é ele fez bem e absorveu o golpe, que foi dado com gosto, e um sorriso pelo policial. 

O que ele fez? Por quê? Aquele segundo que passa o universo na sua mente, você vê tudo claro, sua percepção do tempo muda, saí do abrigo como muitos para longe da confusão. Ao passar ao lado do garoto no chão, vi a marca da bala de borracha no seu peito, ele estava chorando, gritando "Por que seus filhos da puta, sem violência caralho, o que eu fiz!" Peguei o garoto e o coloquei nos ombros, foi a primeira vez que pensei "você disse não ao sistema filho". 

Corri com ele nas costas por duas quadras, ouvi impactos nas portas de aço atrás de mim. Pedras? Não, a polícia atirando em mim que estava correndo, com um ferido nas costas. ( a cadência de fogo de uma 12 e lenta nunca corra em linha reta, movimentos erráticos te ajudam a não ser atingido). 

Parei em uma esquina, meus pulmões ardiam absurdo. Garoto, doí quando você respira? Não "irmão" (foi a primeira vez no ano que houve isso) que houve? Por que? (eu também queria saber, e não sei até hoje) Pressionei em volta da ferida, sem sinal de fratura, apenas o roxo do impacto e um pouco de sangue. "Saia daqui garoto"... foi quando escutei mais tiros. 

Ao contrario do que manda a cartilha minhas pernas correram na direção da "muvuca" e não para longe dela, uma quadra e meia acima, lá estava o "estado" em linha com seus escudos e gritos, "choque, choque, choque", gente no chão, alguns corriam para outras ruas e você via nitidamente pessoas de cinza e capacete branco, convergindo para cima delas, uma coreografia aterradora, alguém cai no chão e aqueles drones de cinza, erguem e baixam seus cassetetes, como se tivessem ensaiado, alguns correm outros de tanto apanhar, ficam estirados no asfalto, e os drones avançam para um, depois para outro, sempre pegando os desgarrados. 

Uma garota estava sentada, atrás de uma árvore, em pânico, fui até ela, ela estava em lágrimas, respirando mal por causa do gás, quem foi o filho da puta que acha que aquilo não é letal, a menina pelo visto tinha algum problema respiratório, deixada sozinha... Ninguem fica para trás. Ombro...correr, até fora da área do gás. Ja não são uma nem duas quadras, exame rápido, você tem problemas respiratórios? Ela moveu a cabeça acenando positivamente. Usa bombinha? Outro aceno positivo, um volume em seu bolso, bingo! Lá esta! dei a bombinha em sua mão.

Lembrei da mesma vontade de um bebe, que suga o seio da mãe, aquela garota com a bombinha. Haviam dois garotos proximos olhando...perdidos... Vocês ai, ajudem esta garota, continuem descendo a rua até não haver mais confusão, parem em um posto de gasolina que estiver aberto evitem avenidas, vão! e se foram os 3... 

O sangue começou a ferver. Por que? Soltaram um bando de cães , em cima de um rebanho... Mais barulho, gritos, e toda hora passava alguém sangrando, um supercílio aberto, uma boca um nariz, o corpo responde rápido e vc se pega correndo novamente . 

Você já não sabe onde esta, são ruas e como em um pesadelo, barulhos, gritos bombas, sirenes. Passa um helicóptero em Vôo baixo, FLIR e holofote de busca ligados. Onde eu cruzei a linha da lei ao pedir educação saúde e menos corrupção? Próximo a porta de um prédio avisto alguém. Parece um mendigo, encolhido em um dia de frio, corro ate lá. 

Mal chego perto uma mão esfolada pede." Me ajuda!" Seu rosto roxo, lábio superior inchado um dos dentes da frente pendurado pela pele na boca. "Vem irmão." (agora todo ferido é meu irmão, é meu amigo, sou eu) começamos a andar uns 20 passos depois escuto gritos. "Para filho da puta!" e o trovão

Pareceu um martelo na minha perna, minha coxa parecia ter pego fogo, a ação na hora e de se curvar sobre o ferido que eu estava dando apoio, continuamos andando no passo que dava. Foi o primeiro impacto da noite...algumas quadras depois, um pouco de água (começaram a aparecer os anjos da guarda com água, lenços com vinagre e algumas pessoas começaram a conversar com o rapaz, foi sair do gás, alguns minutos e uma água que ele já estava bem o suficiente para achar o caminho de casa.

Achei um amigo, (você não tem noção do que é achar uma cara conhecida e amiga no meio de uma situação assim) estou indo embora, essa confusão não é para mim. (Esta é a hora que você pensa em valores, em lições e tudo que você já viveu.)

Me empresta a jaqueta de couro? É sua, não se mate! Vai usar o agasalho? "risos" Puta calor!... ele voltou para casa. Agora com meios de resistir melhor. Uma jaqueta um moletom, duas calças. Hora de voltar. Foram horas intermináveis.

Cada pessoa que socorríamos, alvejados pela polícia, que sabia sim em quem estava atirando, vomitei varias vezes por causa do gás, até uma garota que estava com um lenço no rosto me estender a mão e me dar um lenço. "Aqui isso vai te ajudar." corri muito, hora com homens hora com mulheres nos braços, minhas costas receberam vários impactos, suavizados por causa do couro e do moletom, mas doíam na alma. 

O que eu estava fazendo de errado? Depois de ajudar um garoto com um skate que estava encurralado atrás de uma banca de jornal, encontramos um amigo dele. Ai brother, pega estas joelheiras, manda o pau nos porcos. Me causou uma certa surpresa comecei a olhar ao meu redor com mais atenção, algumas pessoas de preto, com escudos improvisados, estavam ajudando, se pondo entre a policia e nos que socorríamos pessoas. 

Estava ajudando uma senhora a sair da zona do gás, quando passou a primeira granada. Um garoto a chutou para um bueiro, e levantou o dedo do meio para o policial que a disparou. Mais uma pessoa fora da area de confronto. Estava correndo para acudir uma pessoa que estava caída quando vieram a segunda e a terceira. 

Estavam mirando em MIM. Dava para ver. Mascarado,desarmado, pagador de impostos em dia com todas as minhas obrigações e sob a mira de lança granadas de gás e tomando tiros de bala de borracha? 

Corri para outro lado, vieram mais duas. Acima uma linha da choque atirando com lança granadas, a esquerda uns 100 mts, vários capacetes brancos, com seus porretes, sem dó no final da rua mais acima, dava para ver os tático móveis, parados com giro flex acesos. 

O corpo finalmente mostrava sinais de fadiga, dor, sentei atrás de uma árvore tentando calcular, para onde correr. Alguém com um lenço preto no rosto, uma camiseta preta, um escudo de madeira improvisada, parou do meu lado. "Comigo!" . 

Entrei atrás dele, deu para ouvir pelo menos 3 impactos no escudo. Vai vai vai...eu corri...corri até as pernas mal aguentarem que eu parasse em pé. Quem me socorreu não sei, mas com certeza foi a diferença entre me recompor para ajudar no dia seguinte, ou ficar no hospital uma semana devido ao tratamento padrão FIFA da policia.

O que eu fiz de errado não sei, nem os jovens que apanharam naquele dia. Vi a policia batendo, vi jovens desconhecidos defendendo o povo com suas "mãos". A cada protesto, a cada novo escândalo, a cada novo desrespeito com o dinheiro público, a máscara branca, foi ficando mais negra. 

Quanto mais a polícia batia em inocentes, que demandam seus direitos que reagem a exploração, que mostram amar mais ao ser humano, do que a um partido, do que a simples posse de algo. Mais negra a máscara ficava, a máscara ficou negra. O sem violência acabou por dar lugar ao principio da reciprocidade.

Continuo a ajudar as pessoas nas manifestações, mas devido a como o Estado me tratou, questiono agora, se ele e suas maneiras , privilégios e postura quanto as reivindicações do povo, realmente me representa. 

Sou pacífico, mas uso a tática Black Bloc, pois a ação é imediata e este governo não me representa. E você ?

sábado, 23 de novembro de 2013

Falência do Direito Penal

Ainda segundo o controle formal, Zaffaroni identifica que existem instituições que, embora não assumam de forma oficial tal denominação, exercem um poder punitivo e de controle que muito se aproxima do penal, formando sistemas penais paralelos, como, por exemplo, os médicos quando determinam a internação de um paciente numa instituição manicomial sem a certa necessidade possuindo uma natureza prisional (vide o caso de vários dependentes químicos); o recolhimento de moradores de rua por entidades assistenciais; a própria família através da internação de seus idosos; a autoridade militar através do serviço militar obrigatório ou através de suas sanções disciplinares. (ZAFFARONI, E. R; BATISTA, N. Direito Penal Brasileiro – vol. 1. Rio de Janeiro: Revan, 2003. p. 69).
Também identifica o mestre portenho que algumas agências exercem seu poder à margem da legalidade ou excedendo seus limites, ainda que em nome do Poder Público, se distanciando de qualquer legitimidade jurídica, mas sem deixar de usufruir do poder punitivo que será mais intenso quanto for a discricionariedade, formando um sistema penal subterrâneo, como nos casos de execuções, torturas, exploração da prostituição etc.

A prevenção criminal pode ser definida de várias formas: 

- Como dissuasão sobre o potencial infrator, intimidando-o através da criação de leis e maior rigor nas penas (prevenção geral).
- De forma indireta, dificultando a prática do crime através de meios não penais, como a alteração da arquitetura (espaços públicos mais abertos e iluminados), esclarecimento às vítimas em potencial, maior segurança (trancas, cofres etc.).
- De forma tardia, não inibindo o crime, mas evitando a reincidência de seu autor através de políticas penitenciárias de ressocialização. 
- Como também pode se referir à gênese do delito, principalmente quando oriunda de raízes sociais.


Agora reflita e posicione-se da forma que melhor entender.

Mas, sem antes ler o que seguinte:

Uma vez demonstrado que o sistema penal é seletivo, que a maioria dos crimes que são praticados não são julgados e a sociedade convive com eles, fazendo com que apenas uma pequena parcela de infratores seja submetido ao poder punitivo que é estigmatizante, passando por um julgamento que não é imparcial e levado à cumprir uma pena que não ressocializa, um professor holandês chamado Louk Hulsman passou a defender a extinção de todo o sistema penal por concluir que o mesmo traz muito mais malefícios do que qualquer benefício na chamada Teoria Abolicionista. (HULSMAN, L. CELIS. J. B. Penas Perdidas: o sistema penal em questão. Niterói: Revan, 1993.)

Assim, o Garantismo Penal desenvolvido por Luigi Ferrajoli defende um “meio termo”. Partindo dos preceitos iluministas e do conceito contratualista quanto à formação do Estado, segundo o qual cada cidadão deu apenas uma parcela de suas liberdades para que o Estado gerisse suas necessidades e conflitos, mas submetido, assim, a determinados limites, o modelo garantista concorda com todas as críticas feitas ao sistema penal e admite todas as suas falhas, mas percebe que sua ausência seria muito mais nociva, como vimos na aula passada, pois a busca de solução dos conflitos pelas partes poderia nos levar de volta ao Estado de Natureza, à vingança privada.

sábado, 12 de outubro de 2013

Diálogo entre um Advogado e o Surfista

Ao chegar na praia, participei de uma conversa, que me deixou extremamente reflexivo, prometo tentar ao máximo, ser fiel ao conteúdo. Leiam, foi importante pra mim. Defini como: Diálogo entre um Advogado e o Surfista.

adv: Bom dia!
sfta: Bommm diiiiaaaa Doctor;
adv: tudo bem?
sfta: blz brow ... te falar uma parada ... vc conhece aqueles caras da capa preta, não conhece...aqueles que mandam prender e soltar, sabe coé?
adv: sei sim, conheço alguns; 
sfta: então, te falar ... sabe coé ... poh, podia arrumar uma daqueles ordens lá, mandando que todo mundo fosse obrigado a ficar 1h por dia na praia ... sei lá fazendo o que ... ouvindo música, correndo, nadando ou só olhando essa parada maravilhosa ... precisa vê ... isso aqui é feito por Deus cara, conhece ele? tá vendo aquele cara lá descendo a onda ... sabe quem é?
adv: Não
sfta: nem Eu ... essa é a parada, aqui não tem diferença da galera, todo mundo igual, pouco importa o que tem, tá ligado ... esse paraíso foi Deus que fez cara, e ele deixou tudo com agente, mas neguinho fica se matando e até esquece disso aqui.
adv: verdade, to me ligando;
sfta: então, sente a sintonia brow, lugar nenhum tem isso e é de graça, é nosso;
adv: "som de grilo ao fundo" pensando no que acabou de ouvir.
sfta: então vamu surfar?
adv: vamos, aliás, demorô.

Moral da história 1: senti o peso daqueles que estão fadados a decidir o destino da vida das pessoas, como que ser juiz, ou exercer algum tipo de poder, imposto ou natural, tem sua importância, influenciar vidas é algo maravilhoso e ao mesmo tempo tenebroso, e mais, como que está longe das pessoas os acessos a seus direitos ou mesmo deveres, impregnados pelo excesso de formalidades como a tal Exa., Dr., imparcialidade, jurisdição, contraditório, congruência, e outros adjetivos, formas de tratamentos e definições mais, que tanto afastam as pessoas e as tornam céticas quanto à importância e efetividade do direito.
Moral da história 2: a praia é o lugar mais democrático que pode existir, sem carros, roupas, jóias e qualquer tipo de ostentação, pouco importa o dinheiro ou a falta dele, está ali para todos, cujo criador foi e é perfeito, atentando para os mínimos detalhes que apenas aqueles que "perdem" um tempinho ali conseguem enxergar.
Como visto, a inteligência, sabedoria ou a definição que preferir está dentro de cada um, basta descobrir e saber explorar.

Conclusão: será que não está faltando em nossa vidas "perder" 1h por dia na praia?

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

FLAGRANTE FORJADO NO RJ PELA P.M.

Durante o protesto dos professores no dia 30 de setembro, no Centro do Rio, a equipe multimídia do GLOBO registrou o momento em que um policial forja a posse de morteiros para deter um jovem manifestante cuja mochila era revistada. As imagens mostram o policial jogando três morteiros aos pés do menor, que caminhava acompanhado por um grupo pela Rua São José, por volta das 20h30m. Em seguida, ele é algemado por outro PM e levado pela rua, sob protestos de outros manifestantes.
No vídeo, ouve-se claramente o policial dando voz de prisão ao rapaz. “Eu não fiz nada”, diz o jovem, ao ser algemado. “Está preso, está com três morteiros”, responde o PM.
Questionada sobre o flagrante feito pelo GLOBO, a PM, no entanto, negou que o menor tenha sido preso pela posse de morteiros. Em nota, explica-se que “minutos antes de sua detenção, o menor foi visto em correria junto com outros manifestantes mascarados. A autoridade policial o deteve apenas para averiguação. Ele foi liberado na delegacia na presença de uma responsável”. A nota diz ainda: “A acusação de flagrante forjado é grave e, neste caso, equivocada. O menor exposto no vídeo sendo detido pela PM não teve imputada a ele nenhuma posse de morteiro ou similar. Não houve flagrante. Ele foi conduzido para a delegacia onde foi feito apenas um registro de Conduta Atípica”.
Informada de que no vídeo do GLOBO é possível ouvir um policial afirmando que o rapaz estava preso por estar com três morteiros, a PM enviou nova nota, em que avisa sobre a abertura de uma “sindicância para analisar as imagens em que um policial supostamente teria forjado flagrante. As cenas da abordagem serão objeto de análise”.
O vídeo mostra que o adolescente caminhava com um grupo logo antes da revista. Um PM manda parar e avisa: “Vem! Não corre e vem”. Já perto dos jovens, ele manda que se virem e ordena, em tom exaltado, aos colegas: “dura nas bolsas”. Uma amiga do adolescente que tenta acompanhar de perto a revista ouve de um policial o grito: “tira a mão de mim” e depois é empurrada por ele. A tensão aumenta e o PM que ordenara a revista manda que algemem o jovem. Ele foi levado para a 5ª DP (Mem de Sá).
A conduta dos policiais motivou um ofício do deputado estadua Marcelo Freixo (PSOL), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Alerj, endereçado ao comando da PM, à Secretaria de Segurança e à Corregedoria Geral Unificada:
— É preciso que identifiquem os PMs e tomem as devidas providências. Vamos acompanahr isso. É muito grave. Aquilo não mostra apenas o desvio de um policial, mas a conduta de quem esteve no comando daquela operação naquele dia, que é o major Pinto. Ele aparece nas imagens. É o negro alto que carrega algo parecido com um extintor. Naquele mesmo dia, ele foi fotografado jogando spray de pimenta nos professores em frente à Câmara de Vereadores.
O advogado Lucas Sada, integrante da ONG Defensores de Direitos Humanos, estava na 5ª DP (Mem de Sá) acompanhando a prisão de um outro manifestante, quando os policiais chegaram com o menor. Segundo Sada, só ali foram retiradas as algemas do adolescente, que tem 15 anos:
Ele foi algemado sem oferecer qualquer resistência. Isso contraria a súmula vinculante 11, que trata do uso das algemas. Chegando na delegacia, os policiais disseram que a acusação era o porte de uma mochila com morteiros. Mas que não tinham conseguido levar a mochila por conta de um tumulto e porque tinham sido cercados por manifestantes. Eles disseram que o major Pinto apareceria lá com a mochila para comprovar a acusação. Umas duas horas depois, o major chegou e disse que a acusação não seria feita, porque os morteiros estavam no chão, e não na mochila do garoto. Mas disse que ele estava com black bloks e fez uma espécie de sermão para o garoto, falando que ele precisava primeiro estudar para poder ter consciência sobre as questões do país.
Sada contou, ainda, que foi feito o registro apenas da apreensão dos morteiros, sem atribuir a autoria ao menor, e um termo de entrega do menor à mãe.
— Como a PM disse, realmente não houve registro contra o garoto. Mas ele foi detido sob a alegação de estar com os morteiros. Sua condução à delegacia foi abusiva e ilegal. Ele não estava cometendo qualquer ato infracional. Isso é passivel de uma eventual ação de reparação — afirma o advogado.
Leia, a seguir, a íntegra das notas enviadas pela Polícia Militar.
“SOBRE A FALSA ACUSAÇÃO DE FLAGRANTE FORJADO
A acusação de flagrante forjado é grave e, neste caso, equivocada.
O menor exposto no vídeo sendo detido pela PM não teve imputada a ele nenhuma posse de morteiro ou similar. Não houve flagrante. Ele foi conduzido para a delegacia onde foi feito apenas um registro de Conduta Atípica, sem atribuir a ele posse de nenhum material.
O procedimento 005-10087/2013 da 5ªDP (Mem de Sá) registra o encontro de três (3) morteiros na calçada. Não atribui sua posse a nenhum manifestante.
Minutos antes de sua detenção, o menor foi visto em correria junto com outros manifestantes mascarados. A autoridade policial o deteve apenas para averiguação. Ele foi liberado na delegacia na presença de uma responsável.
Vale lembrar que na noite seguinte, de terça-feira (01/10) foram depredadas 23 agências bancárias, e duas lojas de telefones celulares (ambas com furto de material)”, encerra a primeira nota.
Abaixo, a segunda nota enviada pela PM:
“COMANDO DA PM ABRE SINDICÂNCIA
O Comando da PM abriu sindicância para analisar as imagens em que um policial supostamente teria forjado flagrante. As cenas da abordagem serão objeto de análise.Apesar da acusação de haver flagrante forjado, na delegacia não houve nenhum registro de posse de fogos de artifício em face do menor, que foi liberado na presença de uma responsável. O documento de apreensão dos fogos registra apenas que os mesmos foram encontrados no chão.O procedimento 005-10087/2013 da 5ªDP (Mem de Sá) registra o encontro de três (3) morteiros na calçada. Não atribui sua posse a nenhum manifestante.Vale lembrar que na noite seguinte, de terça-feira (01/10) foram depredadas 23 agências bancárias, e duas lojas de telefones celulares (ambas com furto de material)”.



sábado, 28 de setembro de 2013

“OAB dos EUA” quer liberar sociedade de escritórios para não advogados

Seguindo o exemplo do que já existe na Inglaterra e Austrália, os Estados Unidos discutem a possibilidade de ter sócios não advogados nos escritórios. A Comissão de Ética da ABA (American Bar Association), Ordem dos Advogados norteamericana, decidiu recomendar alterações nas regras que regulamentam a prática da advocacia no país para que as bancas possam aceitar profissionais não advogados como sócios.
No relatório, com propostas ainda abertas a discussões, a Comissão de Ética da ABA explica que as alterações não significam abertura de capital da firma, nem formação de sociedade com outras empresas fora do ramo.
A proposta, que teve o tempo de dois anos de discussões e deliberações, tem o objetivo de facilitar a contratação de profissionais de alto nível pelas firmas, especialmente as de pequeno e médio porte.
No entanto, nenhum escritório poderá oferecer qualquer outro serviço ao público que não seja jurídico.

Jogo processual no Direito Penal tem efeito cativante

Tenho uma aluna intercambista,de Portugal, cursando a disciplina de Processo Penal na UFSC. Interessada e estudiosa, após ler os dispositivos do CPP e da Constituição de 1988, decidiu comprar livros de processo penal. Então, um tanto quanto assustada, perguntou-me: “professor, tenho a impressão de que os autores não falam do mesmo texto normativo. E como funciona na prática? Quais regras valem nos foros brasileiros?”
Ora pois. Expliquei da seguinte maneira: se você é jogador de xadrez sabe que poderá chegar em qualquer lugar do mundo e compartilhar as regras. O cavalo anda em “L” de Moscou ao Rio de Janeiro. Assim é que o jogo pode acontecer justamente porque se compartilham as regras.
No julgamento da Ação Penal 470, o processo do mensalão, discutiu-se, com apertada vitória, o cabimento dos Embargos Infringentes, tendo-se como foco a recepção ou não do Regimento do STF. Quando se trata de controle de constitucionalidade difuso, recepção do CPP em face da Constituição, há confusão generalizada. Arrisquei dizer a ela que não temos um processo penal. Mas, sim, vários. Em cada sala de aula, comarca, unidade, Tribunal e eventual composição dos órgãos julgadores, as regras mudam.... É verdade que também mudam conforme o status social do acusado — falarei disso em outra oportunidade. Conforme Lenio Streck, a compreensão inautêntica prevalece e caímos na selvageria do realismo. Diante da multiplicidade de jogadores, julgadores, regras reconhecidas, precisamos de novo instrumental para enfrentamento da questão das regras do jogo, de acordo com o entendimento do jurista Aury Lopes. O ideal seria, por evidente, que houvesse a consolidação das normas, para que assim, e somente assim, pudéssemos articular um jogo coletivo e democrático. Entretanto, essa pretensão é ilusória, além de a norma não segurar o sentido. Daí que permanecer na noção contemplativa e idealizada de um possível processo penal, desconsidera o caos dos foros.
O jogo como categoria universal está presente no processo penal
Entender o processo penal como jogo não é novidade, aponta o jurista italiano Piero Calamandrei. Embora o processo penal exija racionalidade dos jogadores, o exercício do jogo mostra que as decisões são tomadas para além da racionalidade. Daí que a metáfora do Teoria dos Jogos pode ser invocada para modelar, de alguma maneira, a matriz teórica de como as decisões podem ser tomadas, partindo-se do estudo dos comportamentos dos jogadores, julgadores, estratégias, táticas e recompensas.

A noção de jogo é antiga e, com Johan Huzinga (em Homo Ludens), pode-se dizer que “é no jogo e pelo jogo que a civilização surge e se desenvolve”. Daí a pretensão de integrar o jogo no campo do processo penal. O regozijo da vitória, um gol de mão aos 47 do segundo tempo, enfim, as sensações de prazer e decepção estão inseridas no cenário dos jogos, queiramos ou não! A vitória em Embargos Infringentes, pelo placar de 6 votos a 5, depois de toda a batalha processual, representa, aos jogadores, já na prorrogação, a sensação de vitória! E a partida continua.
O jogo fascina, excita, preenche o tédio do cotidiano. O vazio da disputa, está para além do que se pode racionalizar. Qualquer um de nós ao jogar um jogo qualquer (futebol, vídeo game etc.) extravasa, em maior ou menor grau, a irracionalidade. Xinga-se, grita-se, briga-se, comemora-se! No processo penal também! No jogo processual penal joga-se com a antecipação e a recompensa da vitória, por meio da linguagem e suas sutilezas. O processo penal é o mito pelo qual, com a decisão, a ordem das coisas, o acusado e a punição, devolveriam ao ambiente coletivo, mesmo que imaginariamente, a paz! Daí que se pode falar no aparente e no manifesto, a saber, por detrás do jogo público, as motivações, as recompensas, as pretensões, devem vasculhar outros lugares, para além da seriedade de fachada. Daí ser cômico — e temos que segurar o riso — as empoladas regras de tratamento e lições de moral quer atravessam os procedimentos judiciais.
O feitiço cativante do jogo processual
No jogo do processo penal brasileiro, contudo, nem mesmo temos normas compartilhadas. Esse problema torna o jogo dependente do “dono da bola”. Ou seja, em cada unidade jurisdicional, diante da ausência de sentido compartilhado das normas processuais, o jogo apresenta variáveis. E isso é antidemocrático, conforme demonstra Jacinto Coutinho.

O jogador de xadrez sabe que se chegar em qualquer lugar do mundo, mesmo sem falar o idioma, pode jogar com o adversário que se encontra sentado na frente de um tabuleiro. Basta sentar-se e jogar. As regras são compartilhadas. No processo penal o déficit normativo torna o jogo mais complexo, dado que antes do jogo, para que se possa ter êxito, é preciso conhecer o julgador da partida. Saber quais as regras irá aplicar/desconsiderar.
A Teoria dos Jogos pressupõe que a vitória depende da tomada de decisões em cadeia. No decorrer do procedimento judicial, em cada sub-jogo, é necessário o cotejo da estratégia da adversário e do “dono da bola”. Antecipar a melhor jogada possível, os ganhos e prejuízos, a cada momento, parece ser o caminho adequado para tomada de decisões estratégias. Não se trata, necessariamente, de matematizar o Direito — de acordo com o ensinamento de Calvo González —, mas de lançar mão de outra caixa de ferramentas teórica, dada a manifesta insuficiência do Direito para tal. Até porque não se trata de verdade verdadeira, ou seja, opera-se longe da possibilidade da reconstrução do caso penal.
A obtenção da vitória no jogo processual depende de uma série de decisões em cadeia, cuja subsequente vincula-se, necessariamente, ao êxito na anterior. Há uma interdependência das jogadas. Exemplificativamente e do ponto de vista meramente formal: a condenação depende de uma denúncia apta e de defesa existente. Cabe dizer que o êxito de um dos jogadores depende do contendente. Não se trata de um jogo individual, em que o resultado decorre exclusivamente das jogadas individuais. As jogadas, articuladas legalmente, são sempre dialéticas, em contraditório. Daí a importância do contraditório na compreensão do processo penal. Talvez não seja arriscado afirmar que no exercício tedioso do Direito Processual Penal falte emoção. Entendido pela metáfora da teoria dos jogos, quem sabe, possamos entender melhor seu funcionamento, até porque no plano das regras processuais não dispomos de sentido compartilhado. O CPP é de 1941 e a Constituição não convivem harmonicamente. A aluna intercambista perguntou, ao final: “então é um jogo em que a sorte impera?”. “Talvez”, respondi. E isso é democrático? Absolutamente não!
A Criminologia Cultural aponta, desde outro lugar, que o tédio, diante das condições da modernidade, nos diz Jeff Ferrel (e no Brasil Álvaro Oxley da Rocha e Salo de Carvalho), passou a compor a vida cotidiana, fazendo com que o sujeito encontre momentos ilícitos de excitação, ou seja, condutas efêmeras cometidos contra o próprio tédio, dentre eles, arrisca-se, as jogadas processuais ilícitas, as formas de doping processual. O processo penal acaba, pois, transformando-se num grande mecanismo de superação do tédio, mediante a prática de jogadas ilícitas, “jeitinhos processuais”, com as quais o leitor, se tiver paciência, poderá tomar conhecimento na próxima coluna. No momento, basta dizer que as recompensas de descargas de adrenalina que o jogo processual enseja quebram, não raro, o tédio do cotidiano, diante do inesperado. A questão é: isso torna real o absurdo kafkiano?

By Alexandre Morais da Rosa www.conjur.com.br

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Voto do Ministro Celso de Melo - Mensalão

O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, deu nesta quarta-feira (18/9) voto (confira aqui o voto integral http://s.conjur.com.br/dl/ap-470-voto-infringentes-celos-mello.pdf) favorável ao cabimento dos Embargos Infringentes na Ação Penal 470, o processo do mensalão, e assim fechou o julgamento em 6 a 5 pelo recurso. Último a votar na questão, o decano desempatou o julgamento, e assim garantiu a 12 réus o direito de ter parte de suas condenações revista pela corte.
Celso de Mello acompanhou os votos do revisor, Ricardo Lewandowski, e dos ministros Dias Toffoli, Rosa Weber, Teori Zavascki e Roberto Barroso. Ficaram vencidos o relator e presidente do STF, Joaquim Barbosa, e os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Marco Aurélio.
Em seu longo voto de minerva, o decano reafirmou o que já havia dito no dia 2 de agosto do ano passado, quando disse que os Embargos Infringentes estão previstos no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e são válidos.
Celso de Mello disse que a corte não pode deixar se influenciar pelo clamor popular e nem pela pressão das multidões, sob pena de abalar direitos e garantias individuais.
“[Juízes] não podem deixar contaminar-se por juízos paralelos resultantes de manifestações da opinião pública que objetivem condicionar a manifestação de juízes e tribunais. Estar-se-ia a negar a acusados o direito fundamental a um julgamento justo. Constituiria manifesta ofensa ao que proclama a Constituição e ao que garantem os tratados internacionais”, afirmou.
Celso também fez referência ao Pacto de São José da Costa Rica, que prevê o duplo grau de jurisdição como direito de todo réu. “O direito ao duplo grau de jurisdição é indispensável. Não existem ressalvas [quanto a isso] pela Corte Interamericana de Direitos Humanos”, disse Celso de Mello.
Para reforçar ainda mais seu voto pelo cabimento dos Embargos Infringentes, Celso de Mello disse que em 1998 o presidente Fernando Henrique Cardoso enviou para o Congresso uma proposta que acabava com os infringentes. Os parlamentares, entretanto, rejeitaram a ideia.
Dos 25 condenados, 12 terão direito aos Infringentes: João Paulo Cunha, João Cláudio Genu e Breno Fischberg, no caso de suas condenações por lavagem de dinheiro; e José Dirceu, Delúbio Soares, José Genoino, Marcos Valério, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz, Kátia Rabello e José Roberto Salgado, no caso de formação de quadrilha. Simone Vasconcelos poderá recorrer contra a condenação por formação de quadrilha, já prescrita, e contra as penas aplicadas pelos crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

Ordem jurídica

O ministro começou se referindo às condições sob as quais a sessão de julgamento da última quinta-feira foi encerrada (12/9). Os longos votos dos ministros Gilmar Mendes e Marco Aurélio foram atribuídos, por advogados e juristas que acompanharam o julgamento, como expediente para que o voto de desempate do decano fosse adiado. O presidente da corte, ministro Joaquim Barbosa interrompeu a sessão apesar do pedido de Celso de Mello para votar.
O decano disse que o encerramento da sessão na semana passada, “seja qual foi sua causa”, teve sobre ele um “efeito virtuoso”, o levando a “aprofundar sua convicção” já firmada. Conhecido por votos longos e minuciosos, o decano não fez concessões na sessão desta quarta. O ministro atacou ponto por ponto dos votos dos colegas que se posicionaram contra a admissão dos embargos, abordando, para tanto, do Direito imperial português à teoria geral dos recursos.
Em um voto que se estendeu por mais de duas horas, o ministro fez um apelo ao que chamou de prevalência da racionalidade jurídica, que não pode ser submetida “à mercê da vontade e do arbítrio” da coletividade. Antes de abordar a parte mais técnica do seu voto, Celso de Mello disse que, embora todo o poder emane do povo, a representação popular junto ao Poder Judiciário não é exercida diretamente, portanto, não se dá no campo das escolhas políticas, mas da aplicação do Direito. “Só a ordem jurídica constrói”, disse ao defender o respeito incondicional às diretrizes do Direito.
Citando o juiz federal Paulo Mário Canabarro, o ministro criticou abertamente a manipulação do clamor público para se interferir em um processo que deve ser restrito ao ambiente institucional. “Assim como a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem entendido qualificar‐se como abusiva e ilegal a utilização do clamor público como fundamento da prisão preventiva, esse ilustre magistrado federal, no trabalho que venho de referir, também põe em destaque o aspecto relevantíssimo de que o processo decisório deve ocorrer em ‘ambiente institucional que valorize a racionalidade jurídica’”, reiterou o ministro.
Celso de Mello disse ainda que ninguém, independente da gravidade do crime cometido, pode ser privado das garantias fundamentais do direito de defesa, independente da vontade antagônica da coletividade. “O que mais importa, neste julgamento sobre a admissibilidade dos embargos infringentes, é a preservação do compromisso institucional desta Corte Suprema com o respeito incondicional às diretrizes que pautam o ‘devido processo penal’ e que compõem, por efeito de sua natural vocação protetiva, o próprio ‘estatuto constitucional do direito de defesa’, que representa, no contexto de sua evolução histórica, uma prerrogativa inestimável de que ninguém pode ser privado, ainda que se revele antagônico o sentimento da coletividade”, assinalou em seu voto.
O ministro fez uma defesa enérgica da atuação “independente e imune” do tribunal frente ao que qualificou de “indevida pressão externa”. Para o decano, embora todos os todos os cidadãos da República tenham o direito à livre e ampla liberdade de crítica, os julgamentos pelo Poder Judiciário não podem se deixar comprometer por pressões de qualquer ordem.

Reserva legal e procedimental

O primeiro grande argumento do ministro para acolher a admissão dos Embargos Infringentes se embasou na conclusão de que a questão sobre a admissibilidade ou não desse tipo de recurso é uma questão de política legislativa. Celso de Mello referiu-se ao voto do ministro Teori Zavascki ao observar que compete ao Congresso Federal se pronunciar sobre o tema.
“Não se presume a revogação tácita das leis”, disse criticando a ideia de que se pode subentender a revogação de uma norma mesmo que uma lei não trate de sua supressão.
“Sob tal perspectiva e adstringindo-me ao atual contexto normativo ora em exame, tenho para mim [...] que ainda subsistem no âmbito do Supremo Tribunal Federal, nas Ações Penais originárias, os Embargos Infringentes que se referem o Artigo 333, Inciso 1º, do Regimento Interno da corte, que não sofreu no ponto, segundo entendo, derrogação tácita ou indireta em decorrência da superveniente edição da Lei 8038/1990,que se limitou a dispor sobre normas meramente procedimentais, concernentes às causas penais originárias”, disse.
Rejeitando as conclusões no sentido de que o silêncio da lei sobre o cabimento dos infringentes era “eloquente” sobre sua inadmissibilidade, Celso de Mello disse que o silêncio é eloquente porque foi consciente e intencional, ou seja, o legislador se absteve, de forma voluntária, de disciplinar o que já está regulado em sede regimental.
Para o ministro, o fato da Lei 8038 não se referir ao cabimento dos infringentes, não pode, portanto, ser visto como uma lacuna normativa involuntária ou inconsciente. “ Não é um descuido ou inciência do legislador”, disse o ministro. Celso de Mello referiu-se ainda à manifestação do ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça, Hamilton Carvalhido, que observou que a revogação tácita de uma norma só ocorre quando a nova lei regular inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.
Para Celso de Mello, é falsa a ideia de que há uma hierarquia rígida entre a reserva constitucional de lei e a reserva constitucional dos regimentos dos tribunais, sendo que a primeira prevaleceria sobre segunda automaticamente. Em referência a um voto do então ministro do STF Paulo Brossard, no julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, sobre a tensão normativa entre a regra legal e o procedimento regimental, o ministro observou que não pode se afirmar sempre que a lei se sobrepõe ao regimento ou que este se sobrepõe aquela. “É preciso determinar os domínios temáticos que a Constituição traçou, estabeleceu e delineou”, disse. “Dependendo da matéria regulada, prevalece uma ou outra”, disse em referência ao voto de Brossard.
Mas o argumento mais incisivo do decano a favor da admissibilidade dos recursos se referiu ao fato de caber ao Poder Legislativo decidir, com exclusividade, sobre a extinção ou não da norma. Como exemplo, Celso de Mello citou uma exposição de motivos encaminhada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, que resultou num projeto de lei enviado ao Parlamento e que previa mudanças no Código de Processo Civil, na Consolidação das Leis do Trabalho e na própria Lei 8038. Naquele momento, lembrou o ministro, o Executivo reconheceu que a lei de 1990 não tratou da extinção dos Embargos Infringentes nas ações penais originárias no STF, tanto que sugeriu sua supressão.
A proposta foi rejeitada pela Câmara dos Deputados, que usou como base o voto do então deputado federal pelo Rio Grande do Sul Jarbas Lima, que afastou, por sua vez, a abolição e supressão dos infringentes na corte suprema por entender que esse tipo de recurso representa um “importante canal tanto para a reafirmação ou modificação do entendimento do colegiado.

Comprometimento internacional

O ministro Celso de Mello também abordou a questão do comprometimento do Estado brasileiro com tratados e decisões de cortes internacionais de direitos humanos. Na semana passada, o ministro Luiz Fux havia afirmado que o Brasil, por questões de soberania, não precisava se submeter a princípios firmados por tribunais e tratados estrangeiros e que o duplo grau cde jurisdição era um mito jurídico.
O decano disse que, embora não exista uma relação de hierarquia entre o sistema jurídico doméstico e o âmbito das cortes internacionais, há, sim, o compromisso legal que obriga o Estado brasileiro acatar e adotar esses princípios. “Os jornais noticiaram que a República Bolivariana da Venezuela repudiou esse compromisso que assumira anteriormente, [compromisso] que o Brasil mantém íntegro”.