domingo, 22 de dezembro de 2013

Midia e Sistema Penal - Por Nilo Batista

Sabe-se hoje que a criminalização secundária – realizada seletivamente, e ainda assim na dependência de fatores aleatórios que, dentre outros, vão da iniciativa ou omissão da vítima em registrar o delito ao interesse
ou desinteresse da agência policial em investigá-lo – a criminalização secundária não passa de ser pífia amostragem, construída segundo o jogo dos estereótipos criminais e das vulnerabilidades sociais, do grande incognoscível da criminologia: a criminalidade real (ou seja, a totalidade dos fatos que poderiam subsumir-se na programação criminalizante primária, nas leis penais). Por isso mesmo se afirma que o poder criminalizante secundário é “pouco significativo no marco total do controle social”, e que a criminalização secundária “é quase um pretexto” para um “formidável controle configurador positivo da vida social, que em
nenhum momento passa pelas agências judiciais” ; a vigilância sobre a população. Detenções breves, esclarecimentos de identidade, observação das atividades, registros oficiais ou paralelos, “grampos” telefônicos – autorizados ou não –, acesso clandestino a informações sigilosas bancárias ou fiscais são alguns exemplos desse poder de vigilância que o sistema penal, mesmo paralela ou subterraneamente, exerce. O vigilantismo nasceu no capitalismo industrial, e devemos a Bentham sua formulação mais sincera e alucinada. O panóptico não era uma proposta restrita à penitenciária, mas estendia-se às fábricas, às escolas, aos asilos e hospitai. Inteiramente compatível com a idéia benthamiana de que os pobres também deveriam usar uniforme, o panóptico era o princípio básico de uma sociabilidade da vigilância muito cara ao empreendimento burguês-industrial. A prevenção extremada e invasiva deste modelo se inviabilizou espacialmente, na segunda metade do século XIX, com a modernização e o crescimento das cidades. Substituído, na vigilância do disperso exército de reserva da mãode-obra industrial, por um artefato “científico” do positivismo, a periculosidade pré delitual que poderia ativar um medida de segurança detentiva, o princípio hibernaria à espera das condições tecnológicas que lhe concederiam um segundo e glorioso ciclo. Nessa linha, Arlindo Machado pergunta: “o que são os modernos sistemas de vigilância
senão a atualização e a universalização do panóptico”?

Nilo Batista pag. 10 - Midia e Sistema Penal.

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