sexta-feira, 12 de julho de 2013

Essa Noite eu fiquei meio assim pensativo!

O jogo intrínseco à fala mítica revela como o mito resguarda seu poder naturalizado, permanecendo congelado como em um contexto quase que impenetrável através do senso comum, entretanto, perfeitamente acessível pelo simbolismo representativo entendido com certa maturidade reflexiva. Se o mito possui uma intenção, o propósito de notificar algo, isto ocorre porque ele é pleno de motivação, ou seja, de um interesse ideológico que dele se serve para passar uma mensagem sem apresentar claramente sua intenção. Dessa forma.
 O mito instrumentaliza o poder justamente por força de seu poder de fixar um sentido dado como natural. O tabu é a forma como o interdito adquire presença nos costumes, ou melhor, é o dispositivo que o coletivo criou para impor suas proibições, dizendo o que pode e o que não pode ser dito e feito. O mito imanta o tabu de uma fala capacitada a tornar a interdição algo naturalizado; dissocia na sua forma ambígua, a intencionalidade de que é pleno.

 A eficiência instrumental do jogo mítico derramada sobre o tabu faz com que este se transborde em eficácia simbólica. Logo o Mito é algo importante e revelador e ao mesmo tempo perturbador


Europa minimiza princípio da presunção de inocência

A Corte Europeia de Direitos Humanos validou, nesta sexta-feira (12/7), a existência de um terceiro veredicto: absolvição teórica. Os juízes decidiram que um réu que foi condenado, cumpriu sua pena e depois teve sua condenação anulada diante de novas provas não é, necessariamente, inocente. Não tem direito de reclamar indenização por danos morais pelo tempo que ficou preso. A decisão da corte é final.
A presunção de inocência está prevista no parágrafo 2º do artigo 6º da Convenção Europeia de Direitos Humanos. Prevê o dispositivo que todo mundo é presumidamente inocente até que sua culpa seja legalmente provada. No julgamento desta sexta, a corte mitigou esse princípio ao estabelecer que, se a condenação é anulada e não é feito novo julgamento, o réu não pode ser considerado um inocente erroneamente condenado. Não é vítima de erro judicial. Tecnicamente, ele é um inocente aos olhos da Justiça, mas que já passou anos atrás das grades e não vai receber nenhuma compensação por isso.
A história analisada pelos juízes ilustra bem a situação de quem acaba caindo nesse limbo jurídico. A britânica Lorraine Allen foi condenada a três anos de prisão pelo assassinato do seu filho de quatro meses. A condenação foi baseada em laudo médico que apontou como causa da morte do bebê danos cerebrais comuns em crianças que são sacudidas com violência. Depois que Lorraine já tinha cumprido a pena, novo laudo médico colocou em dúvida a causa da morte do bebê. Ela recorreu à Corte de Apelação e a condenação foi anulada. Como a pena já tinha sido cumprida, o Ministério Público não pediu novo julgamento.
Tecnicamente, ao suspender o julgamento que condenou Lorraine, o que a Corte de Apelação fez foi absolvê-la da acusação. A britânica começou uma nova batalha na Justiça para receber indenização por danos morais, alegando que foi vítima de erro judicial. Fracassou em todas as instâncias por não se encaixar em nenhuma das definições britânicas de erro judicial.
Até recentemente, depois de ter sua condenação anulada, o réu precisava provar sua inocência para ser considerado vítima de erro judicial e ter direito à indenização. Em maio de 2011, a Suprema Corte do Reino Unido anunciou o que foi considerado pelos advogados como um dos julgamentos mais importantes da história do país. O tribunal decidiu que, para receber indenização do governo, não é mais preciso comprovar inocência. Os julgadores da corte máxima britânica ampliaram o conceito de erro judicial para abranger também os casos em que a Corte de Apelação anula a condenação do réu porque surgiram provas que, se tivessem sido apresentadas no julgamento, o corpo de jurados não teria decidido pela condenação.
O caso de Lorraine não se encaixou nesse novo conceito de erro judicial porque a Corte de Apelação considerou que, com o novo laudo médico, havia uma possibilidade de que o júri a absolvesse da acusação. Mas, sem essa certeza, não havia como reconhecer que ela era uma pessoa inocente condenada por erro da Justiça.
Para a Corte Europeia, tanto a lei como a Justiça britânica estão de acordo com a Convenção de Direitos Humanos. Os juízes europeus explicaram que a absolvição de Lorraine aconteceu por motivos formais. A Corte de Apelação não analisou o mérito, mas apenas a possibilidade de um eventual veredicto diferente. De acordo com a corte europeia, caberia ao júri — e só a ele — analisar a inocência ou culpabilidade de Lorraine. Sem um novo julgamento, ela não tem como ver sua inocência reconhecida e não tem direito a se declarar vítima de erro judicial

sábado, 6 de julho de 2013

Processo é suspenso após juíza não arrolar testemunha

Os advogados de um réu que respondia por crime contra a ordem tributária conseguiram liminar em Habeas Corpus, suspendendo a tramitação do processo devido a cerceamento do direito à ampla defesa. Segundo a defesa do acusado, a juíza que analisava o caso em primeira instância recusou pedido para acrescentar uma testemunha de defesa à lista. O HC foi concedido na última terça-feira (2/7) pelo desembargador Hermann Herschander, da 14ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça. O pedido aceito foi feito pelo advogado Rafael Estephan Maluf, do escritório Paoletti, Dias, Naves e Carvalho Sociedade de Advogados.
Após ser denunciado por crime contra a ordem tributária na modalidade continuada, o réu alegou que não podia arcar com um advogado. A Defensoria Pública assumiu a causa. No entanto, a Resposta à Acusação foi feita por meio de um documento de apenas quatro linhas, em que o defensor resumiu: “Assumiremos a defesa do acusado Raphael. A Defesa protesta pela inocência dos acusados, arrolando as mesmas testemunhas constantes na r. denúncia de fls, 03 D, protestando-se, desde já, por substituições eventualmente necessárias, pois somente na audiência haverá possibilidade de contato pessoal com o acusado”.
O réu constituiu, então, outro advogado. Rafael Maluf apresentou à juíza Teresa de Almeida Ribeiro Magalhães pedido para que uma nova Resposta à Acusação fosse apresentada antes da audiência de instrução, já que a Defensoria Pública apresentara uma resposta insuficiente. O pedido foi negado, e Rafael entrou com pedido de Habeas Corpus junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo, recebendo resposta negativa — mesmo após o pedido ser reiterado.
Durante a audiência de instrução, o advogado de defesa pediu a inclusão da testemunhas, mas a juíza novamente rejeitou a solicitação e determinou a continuidade da audiência com o interrogatório do réu, permitindo à defesa “juntada de declaração da testemunha apontada”. Maluf apresentou novo pedido de liminar em Habeas Corpus, alegando “fato novo superveniente”, apontando no pedido que houve “claro cerceamento de defesa”.

Dessa vez, o desembargador Hermann Herschander deferiu o pedido, suspendendo o processo até a análise do HC no mérito. O Tribunal de Justiça vai analisar o pedido de anulação da audiência de instrução, a nulidade dos autos desde a arrolação da testemunha e que esta possa ser ouvida.

Despacho Habeas Corpus Processo nº 0117631-14.2013.8.26.0000 Relator(a): HERMANN HERSCHANDER
Órgão Julgador: 14ª CÂMARA DE DIREITO CRIMINAL Vistos.
Ante o alegado, e para evitar cerceamento de defesa, concedo liminar a
fim de que a testemunha Mauro Aranda seja ouvida, como do Juízo. Comunique-se incontinenti.
São Paulo, 2 de julho de 2013.
Hermann Herschander Relator

Dirigir sem habilitação, por si só, não é crime

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais rejeitou denúncia contra um homem que conduzia sem habilitação uma motocicleta. De acordo com o desembargador Duarte de Paula, da 7ª Câmara Criminal, a conduta de dirigir sem habilitação, por si só, não constitui crime. É preciso provar o risco concreto do comportamento do motorista.
O Ministério Público estadual havia denunciado o motociclista para condená-lo de acordo com o previsto no artigo 309 do Código de Trânsito Brasileiro. O dispositivo considera crime de trânsito a condução de veículos automotores sem habilitação. De acordo com o MP, a Polícia Militar flagrou Luiz conduzindo a motocicleta de maneira perigosa, equilibrando-se apenas em uma das rodas. Segundo a PM, ao ser abordado, o condutor assumiu que tinha bebido uma lata de cerveja e que não tinha habilitação. Além disso, a moto não estava devidamente licenciada.
Na primeira instância, o juiz da Vara Criminal de Araguari rejeitou a denúncia alegando falta de justa causa para a ação penal e que o fato narrado não constitui crime. Contrariado, o Ministério Público recorreu ao TJ-MG.
A ação foi julgada pela 7ª Câmara Criminal, que manteve a decisão de primeira instância. De acordo com o relator, desembargado Duarte de Paula o crime previsto no artigo 309 do CTB só se configura caso o condutor esteja efetivamente causando perigo de dano.
Ele explica que o simples fato de conduzir o veículo sem ser habilitado em local público, de forma anormal, em desconformidade com as leis de trânsito, colocando em risco a sua integridade física e a de outrem, já é suficiente para a condenação do motorista. Mas observa que no caso concreto não houve prova acerca do dano concreto. Segundo consta nos autos, o motorista negou estar conduzindo a motocicleta equilibrando-se apenas em uma das rodas e não foram apresentados quaisquer depoimentos de testemunhas que possam corroborar as palavras dos policiais militares.

"Inexistindo provas acerca da existência do dano concreto, a conduta de dirigir sem habilitação não constitui crime, uma vez que, para que seja considerada como fato típico, exige a comprovação de que o agente teria colocado em risco, de forma concreta, a segurança própria ou alheia, não constituindo ilícito penal - mas, mera infração de trânsito - a condução de veículo por motorista inabilitado que não ocasione nenhum risco ou lesão a qualquer bem jurídico. Tanto é assim que no XXI Encontro do FONAJE foi aprovado o Enunciado 98, segundo o qual 'os crimes previstos nos artigos 309 e 310 da Lei 9.503/1997 são de perigo concreto'", explicou.


Diante disso, o desembargador concluiu que a conduta de Luiz, de dirigir normalmente sem habilitação sem expor sua vida e a dos outros em nenhum perigo concreto trata-se de fato atípico. Com isso, o Duarte de Paula votou por confirmar a decisão em primeira instância. O voto do relator foi seguido por unanimidade.

Número do 1.0035.10.012613-1/001 Númeração 0126131-
Relator: Des.(a) Duarte de Paula
Relator do Acordão: Des.(a) Duarte de Paula
Data do Julgamento: 18/06/2013
Data da Publicação: 28/06/2013
EMENTA: CONDUZIR VEÍCULO, EM VIA PÚBLICA, SEM HABILITAÇÃO.
CRIME DE PERIGO CONCRETO. PERIGO DE DANO NÃO
COMPROVADO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. DENÚNCIA REJEITADA.
MANUTENÇÃO.
- Nos termos do Enunciado 98 do FONAJE o ato de conduzir veículo
automotor, em via pública, sem a posse da devida habilitação, somente
constitui crime se desse ato resultar efetivo perigo de dano ao bem jurídico
tutelado.
REC EM SENTIDO ESTRITO Nº 1.0035.10.012613-1/001 - COMARCA DE
ARAGUARI - RECORRENTE(S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE
MINAS GERAIS - RECORRIDO(A)(S): LUIZ SÉRGIO DE OLIVEIRA

Alvará de levantamento deve ser em nome do advogado

O alvará de levantamento de quantia depositada em juízo deve ser expedido em nome do advogado do caso. A decisão é da Corregedoria-Geral de Justiça do estado do Paraná que, provocada por um juiz que pediu orientação sobre como proceder, afirmou que juízes não devem expedir alvarás apenas em nome da parte, como tem sido feito por magistrados desconfiados de que os advogados não estavam repassando os valores devidos a seus clientes.
 O corregedor aponta que o Código de Processo Civil, assim como o Estatuto da Advocacia, garantem ao advogado o direito de ter os alvarás expedidos em seu nome. A regra é clara, diz o documento, assinado pelo desembargador Lauro Augusto Fabrício de Melo: “Se o advogado tiver procuração com poderes especiais para receber e dar quitação, o alvará de levantamento deve ser expedido em nome deste, sob pena de o magistrado entrar em relação contratual firmada entre a parte e seu patrono”.
 Havendo indícios de que o operador do Direito não está agindo corretamente com seu cliente — prossegue a decisão —, cabe ao magistrado adotar as seguintes medidas: exigir procuração atualizada, com firma reconhecida; intimar pessoalmente a parte interessada que está sendo expedido alvará em nome de seu procurador; comunicar a OAB acerca de eventual conduta irregular do advogado; e expedir o alvará de levantamento em conjunto, em nome da parte e de seu procurador, com as devidas comunicações.
 Em ofício encaminhado anteriormente ao corregedor-geral da Justiça no Paraná, a seccional paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil afirma que julgadores “têm inovado, sob pretexto de proteger os interesses das partes, ao determinar que os alvarás sejam expedidos em nome destas, e não de seus patronos”.
 A medida, argumentaram os advogados, viola as prerrogativas profissionais, interfere indevidamente nas relações contratuais e de confiança entre as partes e seus advogados e, muitas vezes, causa dificuldades às próprias partes que, muitas vezes, não podem comparecer pessoalmente para o levantamento dos alvarás.
 Assim, a entidade pede a anulação da Portaria Conjunta 1/2013 do Juízo Cível da Comarca de União da Vitória e todas as outras determinações que criam obstáculos à expedição de alvarás em nome de advogados com poderes específicos para receber e dar quitação.
Para comprovar a gravidade do caso, a OAB citou nominalmente, em pedido anterior, juízes que estavam expedindo alvarás em nome das partes, e não dos advogados. A questão foi exemplificada com documentos apontando os magistrados Sérgio Bernardinetti e Leonor Bisolo Constantinopolos Severo, da Comarca de União da Vitória, e Angela Maria Machado Costa e Eduardo Novacki, da 2ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba e da 4ª Vara Cível de Curitiba.

Dinheiro do cliente
Em sua decisão, o corregedor-geral de Justiça do Paraná, Lauro Augusto Fabrício de Melo, diz que é de conhecimento da Corregedoria que muitos advogados "não exercem com lisura os poderes que lhes foram autorgados por mandato", mas que os juízes não podem tratar os problemas como regra.
 Recentemente, o caso de um advogado gaúcho que se apropriou, via alvarás, de valores depositados em nome de sua cliente ganhou destaque nacional. O valor dos saques chegou a R$ 25,3 mil e a condenação do operador do Direito foi confirmada pela 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. A pena de reclusão, determinada na primeira instância, foi transformada em prestação de serviços à comunidade e multa.
 Após Inquérito Policial, o Ministério Público do Rio Grande do Sul denunciou o advogado por apropriação indevida de coisa alheia em razão da sua profissão. A conduta está descrita nos artigos 168, parágrafo 1º, inciso III, do Código Penal.

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Na prática, plebiscito sobre reforma política é inviável

 O plebiscito sugerido pela presidente da República, Dilma Rousseff, ao Congresso Nacional é juridicamente viável. Mas nem sempre o que parece possível fazer no plano das ideias se revela factível no plano dos fatos. É o caso do plebiscito sobre reforma política. Na prática, a proposta da Presidência, se for de fato encampada pelo Congresso, deve se revelar inexequível. Essa é a opinião dos especialistas ouvidos pela revista Consultor Jurídico.
 Consultas populares em forma de plebiscito e referendo, em regra, devem tratar de temas sensíveis à população, mas cujas questões possam ser plenamente compreendidas. Foi assim em relação ao referendo do desarmamento, feito em 23 de outubro de 2005 — na ocasião, com 64% dos votos, a população decidiu não proibir totalmente o comércio de armas no país. O mesmo ocorreu em 11 de dezembro de 2011, quando 66% da população do Pará rejeitou a divisão do estado em três — seriam criados os estados de Tapajós e Carajás.
 O alerta sobre o necessário esclarecimento popular veio oficialmente do Tribunal Superior Eleitoral, na ata em que a presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, e os presidentes dos 27 tribunais regionais eleitorais do país informaram que a Justiça Eleitoral precisa de 70 dias para organizar o plebiscito. “A Justiça Eleitoral não está autorizada constitucional e legalmente a submeter ao eleitorado consulta sobre cujo tema ele não possa responder ou sobre a qual não esteja prévia e suficientemente esclarecido”, diz o documento.
Nas palavras do ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Ayres Britto, as questões colocadas em um plebiscito necessitam ter “a claridade do sol do nordeste a pino”. Isso fica um tanto difícil frente aos cinco pontos sugeridos pela presidente da República para a reforma política. São eles:

1. Financiamento de campanha — público, privado ou misto
2. Definição do sistema eleitoral — voto proporcional ou distrital.
3. Existência da suplência de senadores.
4. Fim ou manutenção das coligações partidárias.
5. Fim ou manutenção do voto secreto no Parlamento.

Não há dúvidas sobre a legitimidade, do ponto de vista jurídico, de se convocar um plebiscito sobre reforma política. A regra é: o Congresso pode chamar o povo a votar sobre qualquer matéria de sua competência, inclusive questões que seriam aprovadas por meio de proposta de emenda à Constituição. A dúvida que se coloca é sobre o uso do plebiscito para decisões que demandam debates complexos, como o modelo de sistema eleitoral nacional.
 De acordo com o advogado Marcelo Ribeiro, ex-ministro do TSE, a única limitação jurídica do plebiscito são cláusulas pétreas, principalmente quando reconhecidas assim pelo Supremo. Por exemplo, não se pode submeter à população a possibilidade de colocar fim ao chamado princípio da anualidade, segundo o qual só pode haver alterações nas regras do processo eleitoral até um ano antes das eleições.
 “O plebiscito pode e deve ser convocado para decidir questões políticas sensíveis. Mas simples. No caso da reforma política, é inviável na prática por conta das questões muito complexas, de difícil compreensão e polêmicas”, afirma Marcelo Ribeiro.
 O ministro Ayres Britto ressalta que plebiscito e referendo são mecanismos constitucionais de democracia direta. O que, por si só, é bom. Mas há certas limitações. “É preciso esclarecer a população para que não se diga, depois, que se comprou gato por lebre. O plebiscito se traduz em respostas mutuamente excludentes: sim ou não, concordo ou não concordo. Esse tipo de resposta exige perguntas feitas com muita clareza. É preciso que a pergunta seja compreendida instantaneamente pela população. Por isso, não é conveniente convocar plebiscitos sobre temas que demandem uma conceituação muito elaborada”, defende Britto.
 A advogada eleitoral Maria Cláudia Bucchianeri Pinheiro lembra que, historicamente, plebiscitos foram usados para legitimar atos antidemocráticos: “Napoleão Bonaparte, por exemplo, usou plebiscitos para se perpetuar do poder e conferir a si mesmo um poder constituinte. Por isso, não é recomendável fazer consultas sobre temas complexos. Plebiscito pressupõe sempre liberdade de informação. É um instrumento válido e democrático, mas que pressupõe a informação ampla da cidadania para combater manipulações histórias que já foram feitas com o uso desse mecanismo. São necessárias questões objetivas e de fácil compreensão”

Referendo popular
 Muito mais honesto e objetivo, no caso da reforma política, seria a utilização do referendo popular. De novo, o ministro Ayres Britto usa de seus já conhecidos aforismos para jogar luz sobre a discussão. “O referendo é como um cheque preenchido quanto ao valor, destinatário, data da emissão, só precisando do povo para o endosso do cheque. Já o plebiscito é um cheque em branco, porque seu resultado não vincula o Congresso Nacional. É improvável que isso aconteça, mas o Congresso não é obrigado, juridicamente, a votar o que o povo já decidiu em plebiscito”, diz o ministro.
 O ministro Carlos Velloso, também aposentado do STF, reforça que o plebiscito sobre reforma política é “juridicamente viável, mas inviável na prática”. Para ele, questões como as da reforma política devem ser postas a estudiosos antes de serem submetidas à consulta popular. Por isso, também considera que o referendo seria a melhor forma de participação popular nessas decisões.
 De acordo com o advogado eleitoral Rodrigo Lago, o referendo seria algo mais honesto com o eleitor porque ele saberá exatamente os termos das propostas sobre as quais está decidindo. “Ele conhece e escolhe com riqueza de detalhes cada consequência dessas novas regras”, afirma. Para o advogado, o referendo é uma alternativa menos gravosa do que a do plebiscito.
 O advogado, contudo, acredita que a consulta popular, por meio de referendo ou plebiscito, no atual momento, é inviável do ponto de vista político. “Não é recomendável que se empreenda tanto esforço político e dinheiro para fazer mudanças de forma açodada, sem a devida maturação do debate, com o risco de termos de conclamar nova reforma daqui um ou dois anos. É mais prudente o Congresso se concentrar em temas cuja necessidade de mudança é pacífica e enfrentá-los pelo processo legislativo comum”, defende Rodrigo Lago.
 Na mesma ata em que o TSE informou o prazo necessário para o plebiscito, a Justiça Eleitoral ressalta que não pode submeter à população uma consulta da qual a “resposta apurada não haverá efeitos no pleito eleitoral subsequente”. Isso porque pode “ser fator de deslegitimação da chamada popular”. Lago reforça que, de fato, essa deve ser uma preocupação, mas não há nada que impeça que as reformas sejam aprovadas depois de outubro. Mas elas só seriam aplicadas nas eleições de 2016.
 O ex-ministro Marcelo Ribeiro também reforça esse ponto. “Não faz sentido movimentar toda a máquina eleitoral para não ter uma resposta em tempo adequado. Não há vedação jurídica para que a consulta seja feita agora e, respeitando o princípio da anualidade, surta efeito apenas nas eleições de 2016. Mas é de se perguntar se a pressa se justifica neste caso, principalmente em relação a temas tão complexos como o modelo político do país”, sustenta Ribeiro.
 Para a advogada Maria Cláudia Bucchianeri Pinheiro, o referendo seria a melhor alternativa frente ao que se coloca. Mas ela também reforça que alguns dos pontos colocados na reforma atual poderiam ser implementados por meio do processo legislativo regular. Por exemplo, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado admitiu a tramitação, nesta quarta-feira (3/7), da proposta que acaba com o voto secreto no Congresso Nacional. No caso de se convocar um plebiscito, todas as propostas que versem sobre as matérias em consulta têm o andamento suspenso.
 Crítica comum entre os especialistas é o fato de a reforma política por meio de consulta popular ser proposta como uma resposta às manifestações populares que tomaram conta do país nas últimas semanas. A reforma do sistema político tem de ser pensada com mais vagar e densidade. E a falta de resposta imediata no caso de a reforma não ser aprovada antes de outubro pode gerar ainda mais insatisfação. “É necessário saber se vale a pena bancar os custos de movimentar a Justiça Eleitoral nacionalmente para esse fim. Isso pode ir justamente de encontro a uma das pautas dos manifestantes: racionalidade e planejamento para os gastos de dinheiro público”, resume Maria Cláudia Pinheiro.


Por Rodrigo Haidar - conjur 04/07/2013